MARISA MONTE |
No início dos anos 80, quando explodia o rock brasileiro, a
adolescente carioca Marisa de Azevedo Monte queria ser cantora de
ópera. Aos 14 anos, começou a estudar canto lírico e chegou a fazer
vestibular para a Escola Nacional de Música, mas logo descobriria que
amava tanto Maria Callas quanto Billie Holiday, tanto o novo rock
brasileiro como a fina flor do samba carioca, que ouvia nos discos do
pai, Carlos Monte, economista e editor cultural no início dos anos 70.
Depois de participar do musical “Rocky Horror Show”, dirigido por
Miguel Falabella com alunos do Colégio Andrews, Marisa começou a se
apresentar informalmente em barzinhos cariocas. Com 19 anos, foi morar
em Roma, disposta a aprofundar os estudos de canto lírico e fazer
contato com o mundo da ópera, mas alguns meses depois decidiu voltar ao
Brasil e ser cantora pop. Em Roma, deu canjas em barzinhos e, antes de
voltar ao Brasil, em Veneza, fez um show de MPB com um violonista
italiano e foi ouvida pelo produtor Nelson Motta, que reencontraria na
sua volta ao Brasil e dirigiria seus primeiros shows profissionais,
produzidos por Lula Buarque de Hollanda. Desde sua primeira apresentação
no bar Jazzmania, no Rio de Janeiro, em setembro de 1987, Marisa foi
saudada como uma nova sensação na cena musical brasileira.
Depois de pequenas temporadas com lotações esgotadas em teatros
cariocas, Marisa começou a se apresentar em outras capitais com grande
sucesso de público e crítica e a amadurecer seu estilo e repertório,
que ia da MPB ao rock brasileiro, de clássicos de jazz e blues ao samba
tradicional, de Pilip Glass aos Titãs, de Lobão a Gershwin - e
rapidamente tornou-se um cult tanto entre o público mais jovem de rock
como entre o público mais adulto de jazz e MPB. Entusiasmada com o
talento e originalidade de Marisa, que desafiava definições e
impossibilitava vinculá-la a um gênero musical, a crítica a chamou de
“eclética”, pela diversidade e qualidade de seu repertório.
Um ano depois, Marisa apresentava-se no teatro Villa Lobos e gravava
ao vivo um especial de TV, dirigido por Walter Salles (“Central do
Brasil”) e Nelson Motta e exibido pela TV Manchete no final do ano,
antes mesmo de seu primeiro disco ser lançado, em janeiro de 1989. Foi
uma das raríssimas artistas brasileiras a gravar o seu primeiro disco
ao vivo: “MM” integrava samba, jazz, funk, blues, soul, bossa nova e
rock com diversas gerações e estilos musicais. Emplacou espetacular
sucesso nacional com “Bem Que Se Quis”, versão brasileira de uma canção
do italiano Pino Daniele, e foi saudada como grande revelação do ano.
Vendeu mais de 500 mil discos e se consagrou como nova estrela da música
brasileira.
Se em seu primeiro disco Marisa fez sucesso como uma cantora
“eclética”, uma intérprete versátil que imprimia seu estilo e
personalidade a grandes canções de gêneros musicais muito diversos
entre si, já em seu segundo álbum, “Mais” (1991), produzido por Arto
Lindsay em Nova York e com participações de Ryuichi Sakamoto, do
saxofonista John Zorn e do guitarrista Mark Ribot, ela mostrou suas
primeiras músicas em parceria com Nando Reis e Arnaldo Antunes e
afirmou-se também como compositora de grande talento e estilo próprio,
que refletia suas múltiplas influências musicais. Vendeu ainda mais do
que o primeiro, emplacou um grande sucesso popular com “Beija Eu”, com
Arnaldo Antunes e Arto Lindsay, e fez uma turnê de lançamento nacional
consagradora.
Em Nova York, no alternativo e sofisticado Knitting Factory, Marisa
começou sua carreira internacional e seguiu com pequenos shows nos
Estados Unidos e na Europa, com críticas que a confirmavam como a
grande cantora brasileira de sua geração. Pela qualidade de sua música,
pelo vigor criativo de suas apresentações, pela diversidade racial e
musical brasileira. Gravou um dueto com David Byrne em 1995 para a
compilação “Red, Hot and Rio”.
Seu terceiro álbum, “Cor de Rosa e Carvão”, gravado em Nova York e
no Rio de Janeiro, marca o início de sua parceria com Carlinhos Brown
com três grandes músicas, aprofundando ainda mais a integração das
novas formas e ritmos brasileiros com modelos musicais clássicos de
samba, jazz, blues e funk, tendo Laurie Anderson e Philip Glass como
convidados e assinando a produção com Arto Lindsay.
Em uma longa turnê internacional foi gestado o disco seguinte.
“Barulhinho Bom” foi gravado no Rio de Janeiro e provocou grande
polêmica por sua capa, um desenho do artista pornô-naif Carlos Zéfiro.
Um álbum duplo, com um disco gravado ao vivo e outro em estúdio, com
músicas inéditas e regravações e marcado por uma aproximação ainda
maior com o mundo do samba carioca, com suas diversas escolas e
gerações, dos velhos sambistas da Escola de Samba Portela ao samba pop
dos Novos Baianos. Com este show, Marisa ampliou sua carreira
internacional, participando dos maiores festivais do verão europeu e se
apresentando para grandes plateias nos Estados Unidos e pela primeira
vez no Japão.
Em seguida Marisa afirmou-se como produtora, com o elogiado “Omelete
Man”, de Carlinhos Brown, e recebeu críticas consagradoras pelo disco
“Tudo Azul”, com a história Velha Guarda da Portela, documentando uma
das mais sólidas vertentes da musica brasileira e revelando o mundo do
samba tradicional para as novas gerações.
Seu CD “Memórias, Crônicas e Declarações de Amor” (2000), foi
lançado já pelo próprio selo – Phonomotor – e vendeu mais de um milhão
de cópias, ganhou um Grammy Latino como melhor álbum pop e melhor
videoclipe no MTV Awards brasileiro com “Amor I Love You”, um dos
maiores sucessos do ano. Sua turnê teve mais de 150 shows no Brasil e
no mundo e foi registrada em DVD (2001).
Sua paixão pelo samba resultou em mais dois lançamentos do selo
Phonomotor em 2002: os discos solos de estreia de Argemiro Patrocínio e
Seu Jair do Cavaquinho, lendários sambistas da velha Guarda da Portela
que, apesar de estarem na faixa dos 80 anos, nunca haviam lançado
trabalhos individuais. Marisa produziu o álbum de Argemiro.
Em abril de 2002 gravou com Carlinhos Brown e Arnaldo Antunes as
músicas que os três vinham compondo havia mais de um ano, com o nome de
“Tribalistas”, num disco caseiro e artesanal, co-produzido por Alê
Siqueira. Sem dar uma entrevista e sem fazer shows nem apresentações em
TV, logo o disco venderia mais de um milhão de cópias no Brasil e
seria o primeiro grande sucesso popular de Marisa na França e na
Itália, emplacando mega-hits como “Já Sei Namorar” e “Velha Infância”.
Depois do nascimento de seu primeiro filho, em 2002, Marisa
dedicou-se a dois projetos paralelos e muito diferentes: uma profunda
pesquisa do samba carioca e a criação de músicas com Carlinhos Brown,
Arnaldo Antunes, Nando reis, Adriana Calcanhotto, Marcelo Yuka e Seu
Jorge, que resultaram no lançamento simultâneo, em 2006, de “Universo
ao Meu Redor” e “Infinito Particular”. Um com sambas de compositores
históricos e contemporâneos e outro com suas novas músicas e parcerias,
os dois com grande sucesso popular e de crítica, resultando em uma
consagrada volta aos palcos depois de seis anos e nova turnê
internacional.
Em 19 anos de carreira, Marisa vendeu mais de 9 milhões de discos no
Brasil e no exterior e vem ampliando sempre suas plateias e acumulando
prêmios e críticas que a reconhecem como uma das grandes cantoras da
música brasileira moderna, fazendo a ponte entre a tradição e o pop
contemporâneo, integrando gêneros e gerações musicais e surpreendendo
sempre o público com sua originalidade e a qualidade de seu canto, com o
seu talento de compositora e a solidez de suas escolhas musicais.
O segredo do seu sucesso é público e notório: tanto em discos como
em shows, Marisa nunca fez concessões, sempre cantou o que quis, como
quis, com quem quis e quando quis. Cercou-se sempre de grandes músicos e
renovou constantemente seu repertório. Avessa ao mundo das
celebridades, mesmo sendo uma das artistas mais populares do Brasil e
poderosa produtora independente, Marisa leva uma vida discreta no Rio
de janeiro ou viajando pelo Brasil e pelo mundo, a cada novo disco,
quando fala sobre seu trabalho, comenta sua carreira e discute suas
ideias.
NELSON MOTTA
MARISA MONTE |
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